sexta-feira, 19 de agosto de 2011

As figuras bíblicas do Diabo


GOPEGUI, J. A. R. As figuras bíblicas do diabo e dos demônios em face da cultura moderna, in: Perspectiva Teológica 29 (1997) p.327-352.
MORIN, D. Deus e o problema do mal, in: Para falar de Deus. Loyola, 1993. p.121-147.
QUEVEDO, O.    Afinal, que são os demônios?  in:  Antes que os demônios voltem.  Loyola, 1989. p. 257-299.
SUSIN, L. C. O sofrimento da criação, in: A criação de Deus, 119-150.
WENISH, B. Satanismo - missas negras, crença nos demônios, culto das bruxas. Vozes, 1992.

Trabalho apresentado ao curso de Teologia como requisito parcial de aprovação na disciplina Teologia sistemática (antropologia teológica) .

Durante séculos temos exorcizado o Diabo, colocando-o como responsável pelo Mal no mundo, sendo que nas últimas décadas têm-se aumentado as sessões que o expulsam. Fato que não o tirou da realidade e sim o acolheu cada vez mais no cotidiano das pessoas, fazendo com que ele tivesse seus próprios simpatizantes. Ganhando maior repercussão após a obra “O Exorcista” de William Peter Blatty em 1971.
A Igreja Católica, na sua profissão de fé não diz e nunca disse: “creio em Lúcifer, rodeado de seu séquito de demônios, instalados no mundo para fazerem e provocarem a maldade”. Mesmo na Idade Média quando essa infeliz crença esteve presente e manchando sua Tradição, a Igreja não o colocou como Dogma de fé ou parte da Revelação, mas o admitiu como ser capaz de apossar das pessoas e as incitarem a maldade e perversões diversas.
Ao invés de fazermos exorcismos, procurando tirar demônios de pessoas, é fundamental fazer um olhar pela História e entender de onde surgiu esse mito. Por ser uma figura, que surgiu dos mitos de diversos povos, surge o questionamento: “por que Jesus expulsou demônios?”, uma resposta interessante e muito provocadora é encontrada no mesmo livro de Blatty, onde afirma se Ele não os tivesse expulsado, teria sido crucificado três anos antes.
Os deuses da antiga religião sempre tornam-se os diabos da nova”, com essas palavras, citadas por Stewart Farrar[1], torna-se compreensível o povo hebreu ter inculturado diversas fábulas as suas crenças, já que viviam num “corredor” de acesso à grandes potências.
Satã, na Bíblia, não significa um ser sobrenatural que faz maldades, e o nome não tem o mesmo significado de demônio, diabos e outros nomes usados para representar o mal. Cada um apresenta seu significado em seu contexto. Alguns exemplos podem ser citados:
·        Diabo = aparece na tradução dos Setenta; no livro de Henoc e Ap 12,7-11;
·        Lúcifer = Is 14,12; Ap 22,16;
·        Belial = Dt 13,14 e 2Cor 6,14-16;
·        Potestades e demônios = 1Cor 6,3; 10,20ss; Ef 6,11s; Ap 11,20;
·        Belzebu = Lc 11,24-26;
Cada um pode ser explicado, sem precisar especular nenhum ser que toma conta de algum corpo ou que fica causando intrigas. A mais notável explicação é a lenda do zoroastrismo sendo Aura-Mazda assimilado com Miguel Arcanjo e Arimã com Lúcifer, os quais possuem um grande exército, esperando o momento final para lutarem entre eles.
Porém, como seres incapazes de assumir um erro, inconscientemente espelhamos a culpa em alguém ou em algo que não pode ser julgado diretamente, para que assim, possamos tirar o peso que nos cabe. Isso Carl Jung define bem quando cria dois arquétipos do inconsciente, à sombra e a máscara. A sombra é reprimida de tal forma que, em situações onde há um forte histórico de repressão, a telergia transborda como “hemorragia” e faz com que a pessoa entre em estados conhecidos como possessões.
Essa repressão, quando não é expressa em forma de doença psíquica ou orgânica, é transformada em revolta, geralmente a Igreja, a Deus ou mesmo porque não tiveram uma assistência que precisavam. Daí surge grupos de revolta, onde Deus é deixado de lado, e Satã, seu adversário é cultuado. Em resposta a isso, a Igreja deve somar forças para acolher aqueles considerados satanistas, e mostrar que a Bíblia e seu Evangelho não são um freio moral, mas apresentam o plano salvífico de Cristo para todos.
Tem-se exorcizado o que não devia. Pois nossas partes integradoras ficam retidas através de repressões, máscaras, negações e da magia. Por isso, o diabo também deve ter sua redenção, já que ele, como sinal de muitas manifestações da nossa sombra, faz parte do nosso ser. Como foi dito que os deuses das outras religiões são os diabos das atuais, devemos perceber os deuses gregos Dionísio, Pã e Afrodite como partes da totalidade humana. Pois, eles não são ruins, mas cada um carrega o que cada ser precisa para se tornar uma pessoa completa.
Orígenes, Padre da Igreja, pode ter tido pensamento parecido quando afirmou que no final, Deus salvará o Diabo, para que a redenção da Criação seja completa, já que este também faz parte dela. Essa comparação é lembrada por John A. Sanford em “Mal, o lado sombrio da realidade”, paulus, p. 151-152.
Essa redenção ou mesmo despedida do Diabo deve ser considerando-o como ser sobrenatural, e não como manifestação do mal no mundo. Pois o mal existe, devido a isso, é notório entender que quem o produz, na maioria das vezes, são os próprios seres humanos, que no mau uso da sua liberdade, afastam-se de Deus.
Para não jogar a “água da banheira junto com a criança”, é necessário entender que, mesmo acabando com o imaginário demonológico que vive entre os fiéis. Os estudos, e tratados teológicos surgidos em relação a ele, não devem ser descartados e sim deve-se fazer uma nova hermenêutica.
O Diabo que toma posse do corpo de outros, não merece a nossa fé.


[1] in What Wwitches Do, 1971

Um comentário:

  1. Parabéns Paulo Vinícius pela sua ousadia e autoridade em dizer sobre assuntos como esse.
    Sucesso!
    Natália / Betim - MG

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